segunda-feira, agosto 4

2[C]2 .1.

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Muito tempo passou e notei ter perdido então algumas coisas do que poderia ser
Eu ser. Ter sido. Ele - Tudo enfim
Uma sensação estranha se fazia presente durante o tempo todo
O que foi uma nuvem negra e pesada por muito enfim começava se desfazer
Sentia um feixe de luz abrindo acima no Céu; provavelmente aliviando a tensão de tanto tempo.

Por incontáveis vezes em pouco tempo passado, eu abria a janela durante as garoas
Procurava encontra-lo ali, frente a minha casa, esperando e tendo algo para falar
Mas sempre o que via eram árvores molhadas e o vento com força fazendo-as balançar
Ele, na verdade, nunca encontrei por lá.
Sentia-me congelar e isso me fazia feliz. Mas sangrava muito a dor interior, então voltava.
Uma vez quase morri assim.
Voltava os olhos postos ao Céu, a lua, a água que não queria se calar.
Chovia e só chovia por lá. Acredito que por muitos anos
Todos os dias. Todas as noites. Sem cessar.
Eu precisava ver o azul escuro para poder lembrar
Precisava ver a luz do dia para então chorar
Sempre chovendo. Sempre chovendo.
Doia-me os braços, as pernas, meus olhos que não conseguiam se fechar
Não dormia, não comia - vivia a analisar
A cama tinha um cheiro doce, o quarto ar o quente que não me permitia por algum motivo sair
Como não conseguia então, aprendi a viver lá.
Assistindo todas as madrugadas devagar; pouco do mundo estava acordado para acompanhar
Me fazia um estranho bem todas essas horas desse desgastar.
Consegui depois de tantos e tantos dias assim mal vividos, aprender a gostar de tudo que ali se fazia estar
Cada gota que chovia, cada luz que aparecia, cada música que ouvia. E o eu, o eu ali estar.
Então era - Sozinha. Com o tudo daquele nada - Por muito vivi lá.
Certo dia, olhando como de costume à minha janela de vidro embaçado
Por ali ele passou, eu não conhecia, nunca havia visto
Mesmo tendo ficado centenas de tempos há tempos ali sem nunca parar de olhar
Não era comum, nunca passeava por entre as ruas em que eu costumava habitar
Dessa forma, não pude não perceber sua existência nova naquele lugar
Passava por ali, salvando a vida da minha janela embaçada por dias e dias
Eu não conseguia falar.
Minha janela apesar de dar vista a tudo de belo a frente de onde eu vivia
Por algum motivo me impedia de falar
Certo dia, num fim de tarde, como de costume, estava eu deitada de costas para o Sol
Que já começava a em noite se transformar.
Ouvi seus passos e suas mãos duas batidas em minha janela dar
Ele que passava na frente de onde eu vivia vinha me convidar para passear
Falei que não podia, não sabia mais como sair de lá; Sentou a minha frente e então se pôs a chorar
Esperou assim o Sol de vez sair de lá, antes que a lua viesse minha casa clarear - Puxou-me
Tão forte, querendo dali de dentro me tirar. Não conseguia.
Me disse que não sabia o que me fazia ali dentro presa estar
Não haviam grades. Não haviam trancas.
Não enxergava o que me deixava presa dentro daquele lugar
Ele notou em minha roupa manchas e o rasgo do lado esquerdo de minha blusa
Olhou para baixo, levantou os olhos e sorriu
Soube que de costume eu fazia algo que então era certo que me impediria sair de lá
Pediu gentilmente que eu tirasse meu coração, notando que era esse o motivo de meu sangrar
Tirei, com medo da intenção que aquele novo quisesse me causar
Quando tirei, ele quase já não batia, quase nenhuma cor mais havia
Ele estendeu a mão me pedindo para segurar
Fiquei com medo por lhe entregar
Sabendo ele que eu não conseguia dali sair poderia fugir com ele e eu não iria mais respirar
Em suas mãos, ele segurou com força, como sua aparência costumava mostrar
Cortou então o seu próprio lado esquerdo, que estava oco e sem cor. Colocou o meu no lugar
Olhou para o Céu- A lua começou clarear
Pediu minha mão para de novo dali tentar me tirar.


Por algum motivo, sem que nada físico eu visse eu consegui sair de lá.

A janela fechou.
Clareou a luz da lua. Eu e ele
Na rua que apesar de eu sempre habitar, nunca havia saído para passear.